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Slideshow > Museu Aeroespacial recebe expressiva coleção de miniaturas sobre a II Guerra Mundial
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Doação de mil peças de um colecionador plastimodelista promete enriquecer a história da aviação e estará, em breve, disponível para o público no MUSAL.

Em um gesto de profundo valor simbólico, histórico e afetivo, o Museu Aeroespacial (MUSAL), situado no tradicional Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro, recebeu, em abril passado, a doação de uma relevante coleção composta por mil miniaturas de aviões militares, meticulosamente construídas ao longo de mais de seis décadas pelo colecionador plastimodelista Jorge Nacinovic.

A coleção impressiona pela diversidade, riqueza de detalhes e valor documental. São aeronaves de diferentes Forças Aéreas, que atuaram na Segunda Guerra Mundial, incluindo modelos emblemáticos como o P-47 Thunderbolt, utilizado pela Força Aérea Brasileira no teatro de operações na Itália, em 1943. Cada miniatura reproduz com fidelidade camuflagens, armamentos e insígnias, fruto de uma pesquisa minuciosa realizada por “Seu Jorge”, ao longo dos anos.

Para Jorge Nacinovic, a coleção representa muito mais do que um hobby. Ele começou sua paixão pelo plastimodelismo ainda na juventude, inspirado por livros de história militar, filmes de guerra e, principalmente, por seu fascínio pela aviação. “Comecei com poucos kits, ainda na década de 1960. Cada montagem era um aprendizado, um desafio técnico e uma forma de homenagear aqueles que voaram por ideais maiores”, contou, emocionado, durante a entrega das peças.

Ao longo dos anos, o acervo cresceu, tornou-se mais técnico e historicamente rigoroso, com pinturas fiéis, marcações autênticas e referências cruzadas com bibliografia especializada. "Eu me dedicava com muito cuidado a cada montagem. Estudava o contexto histórico da aeronave, suas especificações técnicas, e até mesmo os esquemas de camuflagem usados por diferentes Forças Aéreas. Não era apenas uma questão estética, mas de fidelidade histórica", explicou.

Ao longo dos anos, a coleção se expandiu e tornou-se parte fundamental de sua identidade. As miniaturas eram cuidadosamente armazenadas, catalogadas e mantidas em estantes e vitrines de sua residência. “A cada modelo montado, sentia que estava preservando uma parte da história que não pode ser esquecida”, afirma. Ao perceber que já não poderia manter os cuidados necessários com as peças, Sr. Jorge decidiu procurar a Instituição que compartilha do mesmo compromisso com a memória: o Museu Aeroespacial.

A museóloga Tenente Karina Fátima Gonçalves de Souza explicou que o processo de doação começou a partir de um contato formal por e-mail. “O Sr. Jorge demonstrou interesse em doar sua coleção e, a partir desse primeiro contato, iniciamos os trâmites de avaliação e formalização da doação, seguindo os critérios museológicos da nossa Instituição”, relata. Após uma análise preliminar da relevância histórica e da integridade física das peças, o MUSAL deu início ao processo de incorporação, com o apoio do setor de documentação museológica.

Segundo a museóloga Tenente Cíntia da Silva Figueiredo, cada miniatura foi recebida individualmente, catalogada, numerada e registrada no inventário oficial. “A partir desse momento, os modelos passaram a integrar formalmente o acervo do museu como bens culturais musealizados. Essa coleção é uma fonte valiosa para pesquisa sobre a história da aviação militar e também sobre o plastimodelismo no Brasil”, afirma.

O transporte e o acondicionamento da coleção exigiram medidas específicas de conservação preventiva. De acordo com Tenente Karina, foram utilizadas caixas resistentes com divisórias internas, plástico bolha, espumas e flocos de proteção. “Cada item foi embalado individualmente, evitando qualquer contato direto entre os modelos. O objetivo era minimizar os riscos de danos durante o transporte e garantir que cada miniatura chegasse em segurança ao museu.”

O desafio maior, no entanto, esteve nos detalhes. Algumas peças apresentavam antenas, hélices, trens de pouso e armamentos em escala reduzida. “Esses elementos exigiram manuseio extremamente cuidadoso. Foi necessário um olhar atento e uma abordagem personalizada para cada modelo”, destacou a Tenente Cíntia.

Mais do que objetos de exibição, as miniaturas doadas representam valores imaterial e histórico inestimáveis. “São reproduções que ajudam a contar a história da aviação mundial. Muitas das aeronaves representadas já não existem mais, e essas réplicas se tornam ferramentas educativas e documentais de grande relevância”, ressalta a Tenente Museóloga Karina.

A coleção também permite explorar diferentes contextos da aviação militar internacional, ampliando a narrativa museológica do MUSAL. “Modelos como o P-47 Thunderbolt, caças Spitfire e Messerschmitts, por exemplo, despertam o interesse do público e reforçam a dimensão global da aviação na Segunda Guerra Mundial”, afirma a Tenente Museóloga Cíntia.

A entrega da coleção foi marcada por um momento de emoção. "Foi muito difícil me separar delas, mas também senti que era o momento certo. Eu queria que essas miniaturas tivessem um novo propósito, que inspirassem jovens e ajudassem a preservar a memória da aviação", contou Jorge Nacinovic, com a serenidade de quem confia no valor do legado.

Para as equipes do MUSAL, a experiência também foi tocante. "O envolvimento emocional do doador foi um dos pontos mais marcantes. Ver o carinho com que cada miniatura foi construída ao longo dos anos nos reforça o sentido do nosso trabalho: preservar memórias, histórias e afetos", afirmou a Tenente Karina Gonçalves.

Com a chegada da nova coleção, o Museu Aeroespacial reforça seu compromisso com a educação patrimonial e a valorização da cultura aeronáutica. As miniaturas serão utilizadas em exposições temáticas, ações educativas e oficinas, permitindo ao público uma aproximação sensível e informativa com a história da aviação de combate.

"Preservar esses modelos é garantir que gerações futuras tenham acesso a uma parte importante dos valores material e imaterial da aviação. São objetos que permitem compreender o contexto tecnológico, estratégico e humano dos conflitos que marcaram o século XX", finalizou a Tenente Cíntia Gonçalves.

Enquanto as miniaturas ganham nova vida nas salas de exposição, o gesto generoso de Sr. Jorge Nacinovic inspira outras gerações a valorizar a história e a contribuir com sua preservação. A doação é mais do que a entrega de objetos — é a transmissão de um legado.

 

CONFIRA TRECHO DA ENTREVISTA COM O DOADOR: Entrevista com Sr. Jorge Nacinovic

Realização: Museu Aeroespacial | Local: Residência do doador – Copacabana, RJ | Abril de 2025

Entrevistado: Sr. Jorge Nacinovic – colecionador, plastimodelista e ornitólogo

Entrevistador: Tenente QOCON Jônatas Ribeiro Barbosa (JP35128 RJ)

 

Ten Jônatas Barbosa: Sr. Jorge, como começou essa paixão pelas miniaturas de aviões?

Sr. Jorge Nacinovic: Rapaz, isso começou lá atrás, em 1963. Eu era garoto ainda, e fiquei fascinado quando vi um amigo montando um caça da Segunda Guerra Mundial. Era um Spitfire, se não me engano. Aquilo me encantou. Aí comprei meu primeiro kit, um P-51 Mustang, e não parei mais. Passei a estudar a história dos aviões, das batalhas, das tripulações… Eu queria entender o que levava alguém a subir num negócio daquele pra enfrentar a morte no ar.

Ten Jônatas Barbosa: Sua coleção é muito detalhada. Como o senhor escolhe os modelos que vai montar?

Sr. Jorge Nacinovic: Eu sempre escolhi pensando na história por trás do avião. Tem gente que monta só pelo visual, mas eu gosto de saber onde ele voou, quem pilotou, que missões cumpriu. Tem avião que parece simples, mas teve um papel fundamental numa batalha. Às vezes, descubro um esquadrão pouco conhecido, e aí vou atrás das cores certas, da camuflagem, do emblema. É pesquisa pura. Eu lia muito, comprava livros técnicos, revistas estrangeiras... hoje em dia a internet ajuda, mas na minha época era no olho e no livro mesmo.

Ten Jônatas Barbosa: O senhor tem alguma preferência por uma força aérea ou país específico?

Sr. Jorge Nacinovic: Olha, não. Eu tenho aviões dos Aliados e do Eixo. Aqui tem americano, inglês, soviético, alemão, italiano, japonês… Todos eles. O importante é contar a história como ela foi. A Segunda Guerra foi um conflito mundial, e cada país teve sua dor, seu esforço, seus heróis e até seus erros. Eu respeito todos os lados, mas tenho consciência de que houve ideologias terríveis que precisaram ser combatidas — como o nazismo e o imperialismo japonês. E foi com sangue e coragem que isso foi vencido.

Ten Jônatas Barbosa: A doação da sua coleção ao Museu Aeroespacial tem um valor simbólico muito forte. Por que o senhor decidiu fazer isso?

Sr. Jorge Nacinovic: Porque chegou a hora. Eu já tô com meus anos nas costas, né? [risos] E essa coleção é muito mais do que um hobby. É história pura. Não podia deixar isso se perder. Aqui no MUSAL ela vai ser cuidada, mostrada, estudada… Vai inspirar criança, estudante, pesquisador. Eu fico feliz demais por isso. Agora ela não é mais só minha. Ela é do povo brasileiro.

Ten Jônatas Barbosa: Ao visitar sua exposição, muitas pessoas certamente se emocionarão. O que o senhor espera desse reconhecimento no futuro?

Sr. Jorge Nacinovic: Dá orgulho, claro, mas também uma pontinha de saudade. Cada avião tem uma história comigo. Lembro dos dias em que passei pintando, colando peça por peça, pesquisando, errando e recomeçando. Mas o que mais me toca é imaginar as próximas gerações — crianças olhando com brilho nos olhos, curiosas, perguntando o que é isso ou aquilo. É isso que vale: manter a chama acesa, fazer o povo lembrar do que aconteceu no mundo e do que não pode se repetir. Se isso continuar acontecendo, já valeu a pena.

Ten Jônatas Barbosa: O senhor costuma dizer que as miniaturas também falam de sacrifício. O que isso significa para o senhor?

Sr. Jorge Nacinovic: Significa que, por trás de cada avião, tinha gente. Não eram só máquinas. Um B-17, por exemplo, levava oito, dez homens lá dentro. Gente nova, de vinte e poucos anos, enfrentando antiaérea, caças inimigos, frio de congelar os ossos. Alguns voltavam. Muitos não. Cada modelo que montei, montei pensando nisso. Não é brinquedo. É lembrança. É respeito.

Ten Jônatas Barbosa: Além do plastimodelismo, o senhor também se dedicou à pintura científica de aves. Como essas atividades se relacionam?

Sr. Jorge Nacinovic: Se relacionam no detalhe. Pra pintar ave com guache, você tem que observar muito, respeitar as cores da natureza, a proporção. É o mesmo com os aviões. Eu tratava cada miniatura como uma pintura científica: tinha que ser fiel ao original. E isso me ensinou a ter paciência, rigor, e também a ver beleza onde os outros não veem.

Ten Jônatas Barbosa: Que mensagem o senhor deixaria para quem visita a exposição ou para quem está começando agora no plastimodelismo?

Sr. Jorge Nacinovic: Eu diria: pesquise, estude e monte com o coração. Cada peça que você colar representa mais do que plástico — ali existiu alguém de verdade. Um piloto, um mecânico, um povo. O plastimodelismo não é só um passatempo, é uma ponte com a história. E é essa ponte que vai manter viva a memória, para que as próximas gerações entendam o que foi vivido... e o que não pode jamais ser esquecido.

Ten Jônatas Barbosa: Sr. Jorge, muito obrigado por compartilhar sua trajetória conosco. Parabéns por esse legado.

Sr. Jorge Nacinovic: Eu que agradeço. É uma honra ver minha coleção aqui, entre aviões de verdade, num museu tão importante. Isso aqui é o céu na terra. Que cada visitante possa sair daqui com um sonho a mais — que muita gente continue sonhando em voar, mesmo que em miniatura. E que esse sonho atravesse gerações.

 

Texto: Ten QOCON JOR Jônatas Ribeiro BARBOSA (JP35128 RJ)

Revisão: Cel Av R/1 SARANDI Oliveira da Silva

Fotos:  1S BRENO Fazoli de Almeida e 1S CARLOS Alberto Sales de Sousa FILHO

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