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Prédio do Comando da Universidade da Força Aérea

 

 

Breve histórico do edifício E-004

 

            O edifício E-004  mostra-se como um destacado representante da arquitetura em estilo art déco, no Brasil. Linhas retas, formas geometrizadas e a simplificação dos contornos marcam a configuração básica da fachada da edificação. Três andares compõem o prédio, que são unidos por meio de uma escadaria em espiral no interior. Na face externa, na frente, encontra-se destacado em cinza e relevo o símbolo da Força Aérea Brasileira, o Sabre Alado[1]. O citado símbolo sobressai de maneira significativa na fachada, demarcando o espaço. A escolha do símbolo não é casual. Segundo o filósofo canadense Jean Chevalier, a espada (ou sabre) é, em primeiro lugar, “símbolo do estado militar e de sua virtude, a bravura, assim como de sua função, o poderio” (CHEVALIER, p. 471). O E-004 representou, portanto, quando do tempo de sua construção, o centro da autoridade da Escola de Aviação Militar. A simbologia do sabre alado, tal como se evidencia de forma clara na edificação, é um fato arquitetônico único no conjunto do complexo militar da Guarnição dos Afonsos, o que permite a identificação do prédio como sendo um espaço de autoridade por excelência.

 

            Pode ser evocado também para o prédio E-004 um outro elemento, também relacionado ao reconhecimento da autoridade e comando. Isso se prende a aspectos já antigos que remontam aos anos que antecederam e aos primórdios de criação do Ministério da Aeronáutica. Quando da restruturação do Campo dos Afonsos, após o levante da Intentona Comunista, em 1935, o que havia de escombros da antiga Companhia de Aviação[2], foi definitivamente desmontada. O prédio que havia sido alvejado pelas forças legalistas de Getúlio Vargas e posto abaixo foi totalmente substituído por um novo edifício.

 


 

      Entre os anos de 1937 e 1938 uma outra construção ocupou o lugar, constituindo-se na sede da Escola de Aviação Militar, posteriormente, ainda sob a égide do Exército Brasileiro, renomeada para Escola de Aeronáutica Militar (1938), Escola de Aeronáutica do Exército (1939). Os arquitetos e projetistas conceberam a edificação para uma finalidade muito clara, a de ser a sede da organização militar dedicada a formação dos aviadores, primeiro, do Exército, segundo, da Força Aérea Brasileira.

 

      O pavilhão central do novo prédio, com três andares, passou a concentrar  todas as ações administrativas da Escola de Aeronáutica (1941), reservando o segundo andar para a sala do comando e para o Salão Nobre. No segundo andar, o prédio abrigou a sala do diretor da unidade militar de ensino, sendo ali seu centro de comando, ladeado pelo Salão Nobre, espaço onde importantes solenidades deveriam ocorrer. Na parte externa, na frente, sob uma marquise e diante desta, situa-se um espaço reservado a formaturas e a paradas militares, em sua origem.

 

 

 


 

            No dia 27 de janeiro de 1941, com a criação do Ministério da Aeronáutica, toda Guarnição do Campo dos Afonsos passa às mãos do Ministro Salgado Filho. A nova força armada, a Força Aérea Brasileira, ocupou-se com o sítio já constituído, apropriando-se do legado e das experiências passadas. A nova autoridade representou ao mesmo tempo ruptura com a antiga instituição e continuidade de tradições e honra.

 

 

 

O ritmo de vida e o cotidiano necessário à rotina militar se preservaram. O espaço cerimonial continuou, agregando novos atores. Foram apropriadas antigas simbologias, juntamente com a estrutura física e estética da aviação do Exército Brasileiro. Uma das primeiras cerimônias com a presença de Joaquim Pedro Salgado Filho, primeiro Ministro da Aeronáutica, ocorreu no Salão Nobre, da recém-criada Escola de Aeronáutica. Neste pomposo recinto, repositório de fortes tradições, o ministro recebeu a Arma da Aviação do Exército das mãos do Ministro da Guerra. Sucessivas visitas e inspeções do Ministério Salgado Filho vieram a ocorrer sempre nos mesmos pontos, nos mesmos salões do prédio do Comando da Escola de Aeronáutica, servindo de modelo para solenidades que vieram a ocorrer.

 

 

            O espaço, portanto, além de demarcado pelas rotineiras atividades militares, cerimônias, solenidades, administração e ensino, a presença de Salgado Filho representou uma refundação do espaço histórico, ressignificando-o para as gerações que se formaram a partir deste momento. Delimitou-se, a partir de então, parte importante da imagem da instituição militar, erigindo o prédio E-004 como um valioso lugar de memória da Força Aérea Brasileira. A transição da Escola de Aeronáutica para Pirassunga, em princípios da década de 1973, não implicou a descaracterização do edifício, que foi ocupado pela Universidade da Força Aérea, em 1984, retomando a função como sede de uma organização militar de ensino.

 

Conceitos: memória, lugar de memória e patrimônio arquitetônico

 

            A palavra memória tem um amplo leque de significados. Geralmente, é identificada como recordação do passado. Vulgarmente, tem por acepção geral a capacidade de preservar informações, a nível individual e coletivo. Para além do significado individual, quando elemento importante da experiência de vida da pessoa, destacamos aqui a sua relação com a formação de grupos humanos, o que torna a memória um recurso da recordação social, a memória coletiva e a identidade. Como faz destacar o sociólogo francês Maurice Halbwachs, “o indivíduo que lembra é sempre um indivíduo inserido e habitado por grupos de referências; a memória é sempre construída em grupo, mas também, sempre, um trabalho do sujeito” (HALBWACHS, 2006). Esta apropriação ativa por parte do ser social mostra-se de extrema importância na investigação historiográfica, que pode daí extrair valiosos dados sobre os grupos e o papel que atribuem a si.

 

           

            A memória pode ser abordada por algumas perspectivas históricas. Destacamos, para o presente caso, os aspectos ligados à memória social, conforme se posiciona Patrick Geary, como algo pertinente à sociedade, vinculando a experiência passada com a identidade do presente. É um instrumento de reprodução social que faz com que os indivíduos e os grupos entrem em contato íntimo com o passado (GEARY, 2002). Por sua vez, o lugar de memória — especialmente importante para nossa proposição — são lugares associados a um conjunto específico de recordações, ritualização, símbolo de um grupo, criador de identidade. O historiador francês Pierre Nora ressalta a conexão deste fenômeno mnemônico com realidades materiais e construções humanas, daí resultando a valorização de objetos que, além de contar com seus empregos funcionais, rotineiros e cotidianos, também tem pleno significado e valor simbólico (NORA, 1993). Convergindo com esta abordagem, o historiador Jacques Le Goff destaca a importância que os monumentos e edificações para a sociedade e/ou segmentos dela (LE GOFF, 1990), o que mais uma vez põe em relevo o papel ativo do homem neste esforço de valorização. Em suma, o lugar e o prédio não tem um valor per si, apenas quando o agrupamento social lhe confere a devida importância.

            O enquadramento da Guarnição do Campo dos Afonsos, em especial aqui o edifício E-004, liga-se justamente ao seu enquadramento como lugar de memória para a Força Aérea Brasileira. Não apenas para aqueles que testemunharam diretamente a gênese do Ministério da Aeronáutica, mas para todos aqueles que foram, direta ou indiretamente, calcados nos valores formadores dos membros desta Instituição. O prédio E-004 configura-se, portanto, como um patrimônio arquitetônico. Como destaca Sílvio Oksman, desde o século XVIII, a preservação de construções e edifícios é discutida a partir do “ponto de vista de uma ação cultural”, ou seja, o debate sobre a conservação de uma dada edificação vincula-se a necessidade de “conservação de valores representativos de um momento histórico e artístico de determinadas épocas” (OKSMAN, 2011, p. 28). Desta maneira, como destaca o autor, a finalidade desta preservação é a “transmissão destes valores às gerações futuras” (OKSMAN, 2011, p. 28).

           

Considerações

 

            Identificar os significados de edificações corresponde a compreensão de seu papel para o grupo de usuários imediatos de suas instalações e o seu lugar no devir histórico da nação que o produz. Os adornos, detalhes, configurações e posicionamento em um plano permite observar as pretensões de seus idealizadores e o destino definido para as construções. Os símbolos que ostentam são demarcadores de funções e missões, informam quem é a coletividade que circula por suas dependências, portanto, a edificação e os elementos que a compõe precisam ser vistos na sua relação com seus usuários imediatos, o grupo que a reconhecem como um lugar de identidade.

            O prédio E-004 representa um marco nas origens do ser militar da Força Aérea Brasileira, preserva em sua superfície os ícones de distinção e tradição. Os passos daqueles que auxiliaram na construção da Aeronáutica, as grandes personalidade que ocuparam posições de destaque na história da instituição e as memórias daqueles que lutaram pelo país estão fisicamente presentes por meio da concretude da edificação.

 

 Autores:

Prof. Dr. Bruno de Melo Oliveira

Prof. Dr. Jefferson Eduardo dos Santos Machado

1o. Ten. Andréa Silva da Costa

3o. Sgt Jairo de Paula Baptista

 

Bibliografia e fonte:

 DAVIS, Howard. The culture of building. New York: Oxford University Press, 2006.

NORA, Pierre. Les lieux de mémoire. Montividéu: Trilce, 2008.

LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas, SP Editora da UNICAMP, 1990.

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006.

MORAES, Fernando. Montenegro: as aventuras do marechal que fez uma revolução nos céus do Brasil. Planeta, 2006.

CHEVALIEAR, Jean. Diccionário de simbolos. Barcelona: Herder, 1986.

PERALTA, Francisco José. A Arquitetura art-déco no governo Vargas: a construção

de uma identidade nacional. Maringá, 2005.

NORA, Pierre. Entre memória e história: o problema dos lugares de memória. In: Projeto História. Programa de Pós-Graduação de História da PUC-SP. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/viewFile/12101/8763. Acessado em: 19 out 2017.

OKSMAN, Sílvio. Preservação do patrimônio arquitetônico moderno: a FAU de Vila Nova. São Paulo: 2011. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16136/tde-18012012-144727/. Acessado em 10 out 2017.

MANUAL de uso de marca da Força Aérea Brasileira: atualizado pelo Centro de Comunicação Social da Aeronáutica. Brasília, 2011.

 

[1] O sabre alado originariamente representava a Arma da Aviação do Exército Brasileiro. O símbolo foi apropriado e modificado em suas linhas, representando o elemento iconográfico primordial da Força Aérea Brasileira (MORAIS, 2006, p. 96). O símbolo remonta à criação da Arma da Aviação, em 1927, mas somente foi oficializado pelo Decreto n° 20.754, de 4 de fevereiro de 1931. O gládio foi aprovado como símbolo da Força Aérea Brasileira pelo Decreto-Lei n° 3.323, de 30 de maio de 1941, sendo, em 1952, modificado para os padrões atuais pela Lei n° 1.654-A, de 1° de outubro de 1952 (Manual, 2011, p. 3)

[2]     O prédio da antiga Companhia de Aviação foi construído em 1922, nos primeiros anos de funcionamento da Missão Francesa de Aviação Militar.

[3]     Destacamos duas solenidades de grande relevo para a história da Força Aérea Brasileira. A primeira refere-se à passagem de pasta ministerial a Salgado Filho, que se realizou no Gabinete do Ministro da Justiça, no dia 23 de janeiro de 1941 (CORREIO DA MANHÃ, 1914, p. 3).  No dia 27 de janeiro, no Campo dos Afonsos, o Ministro da Guerra, o General Eurico Gaspar Dutra entregou a Arma da Aviação do Exército ao novo ministério (GAZETA DE NOTÍCIAS, 1941, p. 1). No mesmo dia, às 16 horas, ocorreu a cerimonia de incorporação da Aviação Naval ao Ministério da Aeronáutica (A NOITE, 1941, p. 2).

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